Pedagogia da Cooperação e Cultura Regenerativa – Caduceu do Século XX!

Regenerative Agriculture

Ecovila Findhorn: 60 anos de experimento de cooperação entre e dentre os sistemas vivos

Se os gregos tinham seis formas de amar- eros, philia, ludus, agape, pragma e philautia -, os budistas, quatro estados sublimes da mente - metta, karuna, mudita e upekkha -, de quantas formas de cooperação o mundo atual necessita?  E como cultivá-las?

Vamos imaginar um mundo vivo e interdependente onde os sistemas humanos e biológicos estão em constante diálogo. No paradigma antropocêntrico, este diálogo é conduzido por humanos - mesmo que cooperativos entre si, mas dissociativos da rede da vida. O antropocentrismo pode ser definido como uma disciplina filosófica dentro da ética ambiental que adota um sistema de crenças centrado no ser humano, que vê a natureza como um meio para sustentar seu bem-estar.  Esta visão é desafiada por interpretações biocentristas que enfatizam o valor intrínseco de todos os seres vivos e argumentam que o desenvolvimento humano carece de significado sem um planeta vivo e saudável. Ao expandir ainda mais este pensamento de contorno Gaiano, podemos dizer que…

…Ser humano é estar conectado com tudo que respira e transpira.  A forma como conectamos é o território da cooperação.

Rumi dizia que existem 1001 formas de se ajoelhar e beijar a terra. Existe uma forma de se ajoelhar que defende a perspectiva clássica darwinista sobre o mecanismo da evolução, onde a competição entre os seres vivos é um elemento inerente à ‘luta pela existência’ e, portanto, a base da seleção natural. Outra forma de se ajoelhar considera a cooperação, o igualitarismo, o altruísmo como naturais aos seres humanos.

Recentemente, biólogos evolucionistas, primatologistas, antropólogos e outros cientistas sociais encontraram dados sobre comportamento aparentemente altruísta em muitas espécies animais, bem como nas sociedades humanas, que não estão de acordo com os modelos evolutivos baseados na competição e no impulso da transmissão de genes egoístas.  Estas foram as características que prevaleceram na vida humana por dezenas de milhares de anos. Como observou o antropólogo Bruce Knauft, nossos ancestrais caçadores-coletores podem ser caracterizados por um igualitarismo político e sexual extremo.

!Kung Cooperative People

!Kungs do Deserto Kalahari

Um dos povos mais antigos habitam o Kalahari há 20.000 anos e guardam a essência da cooperação

Photo ©Pixabay

Um exemplo é dos !Kung, da África Austral, que trocam flechas antes de ir caçar e, quando um animal é morto, o crédito não é de quem disparou a flecha, mas da pessoa a quem a flecha pertence - homem ou mulher -, que então assume a tarefa de distribuir a caça para todos do grupo. E, quando uma pessoa se torna muito dominadora ou arrogante, ela é temporariamente excluída pelos membros da comunidade. Nesta perspectiva, indivíduos que se comportam de maneira egoísta têm menos probabilidade de sobreviver, uma vez que são exilados de seus grupos.

Na emergência dos ‘coletivos’ humanos contemporâneos, a cooperação enquanto elemento alquímico atemporal ajuda na fermentação de experimentos de organizações-de-centro-vazio, plataformas sociocráticas, ecovilas e ecobairros, redes de transição e metarredes.

Mas a cooperação sozinha talvez não consiga criar a transformação necessária para o reposicionamento da presença humana no planeta vivo.

Bebendo na fonte da regeneração

Vamos então imaginar um caduceu alado mercuriano guiando os experimentos de comunidades de aprendizado do século XXI, onde uma serpente é a cooperação e, a segunda, regeneração. A interação das duas serpentes no nosso mundo volátil, imprevisível, complexo e ambíguo alimenta a memória da criação do mundo e mantém aquilo que Liebniz chamou de vis viva - o potencial vivo - que anima a força da criação se autorregenerando.

Assim, além dos sistemas fechados, ou mesmo abertos, a pedagogia da cooperação do mundo de hoje abraça a perspectiva dos sistemas vivos, onde cada interação entre os componentes do sistema contribui para saúde do todo. Nesta perspectiva, os elementos são definidos por seus intercâmbios e não tanto por suas fronteiras. E as capacidades de cooperação são despertadas pela experiência de coletivos complexos e não por meio de informação ou instrução pedagógica, controladas pelo ‘professor’. Em síntese, a externalização da cooperação acontece através de uma pedagogia dialógica entre e dentre os elementos de sistemas aninhados onde maximizamos a vida e minimizamos a degeneração.  

Solo sadio = comunidade saudável - colaboradoras de Khulna em Bangladesh preparando o solo para a próxima colheita.

Esta publicação demonstra esta hipótese ao averiguar como indivíduos, instituições e comunidades vivas funcionam - por quais relacionamentos e interdependências eles se sustentam, transformam e prosperam. Esta pedagogia ativista não compromete a prática cognitiva enriquecedora de quando aprendemos através da reflexão, cogitação e pensamento. O equilíbrio fino entre motivação, engajamento social e construção de conhecimento guia esta aventura da pedagogia transformativa que promove cooperação na regeneração.   Seu processo de aprendizado propõe o relacionamento cooperativo como componente essencial de qualquer sistema que se regenera e, ao se regenerar, prospera em vitalidade e viabilidade.

Este é um livro importante que merece ser lido e debatido amplamente - em última análise, seus co-autores trazem uma mensagem de esperança e potencial. Ele nos desafia a pensar o sistema e não ‘pensamentar’ o linear, a transcender o egocentrismo, abraçar a intensa conexão e vivacidade que as práticas cooperativas e a busca da regeneração podem nos trazer. Ele apresenta uma visão de um futuro possível em que não haja supremacias, predomínio masculino e desigualdade social, e sem dominação de outras espécies e do mundo natural.  Desfrutem!

Prefácio do livro Pedagogia da Cooperação como uma abordagem para promover um mundo mais sustentável e colaborativo


Para participar destas reflexões e explorar formas the regenerarmos nossas alianças afetivas com todos os sistemas vivos junte-se a mim e uma multitude de experiências e vivências durante o FICOO- Festival Internacional da Cooperação em Brasília do 12 ao 14 de Outubro.

May East